Muitas mulheres compartilham histórias semelhantes: criar, educar e participar da vida de um filho sozinha. O termo “mãe solo” hoje é amplamente utilizado para designar mulheres que são inteiramente responsáveis pela criação de seus pequenos, deixando o conceito de “mãe solteira” em desuso, já que estar ou não em um relacionamento com um(a) parceiro(a) não quer dizer necessariamente compartilhar a difícil missão de ter um filho.

Seja por escolha própria ou por acaso do destino, ser mãe solo não é nada fácil. Há que ter muita força, paciência e resiliência. Ser uma e valer por mil. Engolir os desaforos e deixar passar os olhares tortos cheios de julgamento de quem não sabe nada sobre criar um filho sozinha. É enfrentar o mundo com unhas e dentes afiados, e um coração cheio de amor e esperança de que a sua vida e a de seu filho seja a melhor possível.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), são 57,3 milhões de mães solo, isto é, 38,7% de brasileiras chefiando seus lares. Mesmo sendo grande parcela da sociedade, elas ainda sofrem e precisam se reinventar todos os dias para poder realizar tanto a si mesmas, quanto aos filhos.

Rosangela Dolores de Freitas tinha só 18 anos quando ficou grávida. “Quando saiu o resultado, meu sentimento foi de pânico absoluto. A minha vida financeira tinha começado a fluir, estava cheia de sonhos e objetivos, a juventude a flor da pele. Tinha o medo de encarar toda a família e, o pior, o medo de não ser uma boa mãe”. Com a ajuda da família, ela conseguiu criar o filho Caio, hoje formado em comércio exterior.

O impacto psicológico

“Tive que me reinventar. Tinha que ser forte por mim e por ele,  tive depressões que não revelava a ninguém, tinha uma mistura de sentimentos de um amor exorbitante, misturado com a sensação de pânico e incapacidade”, conta Rosangela.

Ser mãe não é fácil, ainda mais quando você não se encaixa no perfil que a sociedade tem de família: pai, mãe e filhos. Assim, o psicológico da mãe solo é colocado em risco através de diversas situações cotidianas, mas extremamente prejudiciais. A ansiedade, depressão e estresse podem surgir quando essas mulheres não são amparadas.

A depressão é duas vezes mais frequente nas mulheres. Uma das explicações para esse fenômeno são as alterações hormonais que acontecem durante os ciclos de menstruação e após menopausa.

Segundo o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), as mulheres trabalham cerca de 7,5 horas a mais do que os homens em uma semana. Isso se deve ao fato de sua jornada dupla de trabalho, entre emprego e atividades em seu próprio lar.

O estresse feminino é, culturalmente, tomado como normal. Mas não é! Além do esgotamento físico feminino, esta rotina pode também causar início a transtornos psicológicos, depressão, estresse e Burnout.

O julgamento

Um dos grandes desafios em criar um filho sozinha é o julgamento por parte da sociedade, já que o que é considerado “normal” é uma mulher se casar e ter filhos. Muita gente ainda aponta o dedo e tece comentários do tipo “mas você não se cuidou?” ou “como pôde deixar isso acontecer?”, culpando a mulher por ter sido irresponsável e inconsequente, como se conceber um filho fosse tarefa para uma pessoa só. O machismo ainda perpetua essa visão, o que torna a batalha das mães solo ainda mais desafiadora.

A designer Nadji Silva, hoje com 30 anos, sabe bem o que é enfrentar os olhares tortos e julgamento. Ela engravidou do Miguel quando tinha 18 anos e cursava o primeiro ano da faculdade.

“Eu virei minha vida de ponta cabeça, invertendo todo o processo de “como ter uma vida feliz”. Quando você engravida e é mãe nova, todo mundo te julga, até nós mesmas! “Que tipo de garota, sou eu? Como foi acontecer isso comigo? Olha o que eu fiz com minha vida! Não vou ser capaz de cuidar de uma criança, não agora!. Enfim, um milhão de coisas passam na cabeça e infelizmente nos responsabilizamos muito, nos sentimos culpadas de ter permitido que esse tipo de coisas aconteçam em nossas vidas, principalmente quando não é planejado”.

Patricia Andrade Machado é paulistana, mas morava e trabalhava como coordenadora de projetos sociais no Amazonas quando engravidou. “Quando soube da gravidez, ficamos felizes”, conta. Hoje, Felipe já tem 18 anos, mas a pressão de ser mãe solo e as exigências disso ainda são grandes desafios.

“O pior julgamento era o meu, por ter optado pela carreira e ter precisado ficar longe dele por alguns anos. Até hoje, quando preciso viajar, me sinto culpada. A terapia me ajudou a entender que tudo ficou bem mesmo com essa decisão, mas ainda preciso resolver algumas questões internas”.

O preconceito

Assim como tudo o que não segue o padrão imposto pela sociedade, as mãe solo também precisam enfrentar o preconceito. Ele aparece escancarado, com as perguntas diretas, até os preconceitos sutis como os olhares durante as festinhas de escola.

“Você repara nos olhares de julgamento: alguns olham com dó, outros com reprovação. E isso partia de amigos, vizinhos e até alguns poucos familiares. Estas situações por vezes me privaram de ir e vir porque me sentia extremamente envergonhada e muito, mas muito carente e sozinha”, conta Rosangela.

Nadji também conta que já sofreu muito preconceito, principalmente nas escolas onde o filho estudou, seja por parte das outras mães ou até por parte dos professores e diretores.

“Estou longe de ser perfeita e nem quero isso, mas é uma batalha diária enfrentar os preconceitos. Ainda passo por situações chatas, com olhares, comentários indiretos “Ele é seu irmão? Vocês são tão parecidos!” ou até com outras mães “Ela é estranha, melhor não falar com ela”. Uma coisa que aprendi na vida é se importar menos com o que os outros dizem sobre você, porque só nós mesmo sabemos o que são nossas dores e alegrias. E quando você se deixa levar pelo que os outros dizem, fica pior e acaba perdendo o rumo”, explica.

Os desafios

Na época da gravidez, uma gestação de risco, Patricia teve que deixar o trabalho nas aldeias de lado para cuidar da sua saúde e da do filho. Ela contou com o apoio da família e do marido, pai do Felipe, pois na época eram casados. Porém, com o distanciamento que o trabalho do marido exigia, Patricia se viu mãe solo ainda em um relacionamento. “Me sentia sobrecarregada”, explica. Com a chegada do divórcio, ser mãe solo se tornou oficial e os desafios cresceram.

“Para mim sempre foi um desafio criar o Felipe sozinha, porque conciliar o meu trabalho com isso é muito difícil. Meus pais sempre me ajudaram e o auge do desafio foi quando voltei a trabalhar no Amazonas”, conta.

Bruna de Lira Soares Faria foi mãe solo por pouco tempo. Ela cursava o 1º ano da faculdade de Letras quando descobriu que estava grávida.

“A descoberta da gravidez foi assustadora, principalmente pelo fato de que, após a descoberta, o pai decidiu não  estar presente. Foram meses difíceis e solitários. Eu estava assustada e cheia de medos, mas os cuidados dos meus pais, o amor e ajuda financeira fez com que o tempo passasse e eu pudesse perceber que não ter um pai para a minha bebê seria algo a ser superado com muito amor”, explica.

Durante a gravidez, ela pensava nas festinhas de dia dos pais e em todas as situações pelas quais passaria. Logo em seguida, ainda durante a gestação, ela encontrou o Ricardo, com quem é casada até hoje e quem a ajudou a criar a Lana, hoje com 13 anos, como filha.

“Depois de 13 anos, sinto muito orgulho da minha história e a certeza de que ter um pai não é essencial, mas ter amor, sim”, conta.

Nadji também sabe como é difícil conciliar casa, filho, profissão, vida social, sonhos e planos.

“Lições de casa, provas, reuniões, passeios, datas comemorativas, amigos e o bullying, tudo isso acontece ao mesmo tempo. Administrar todos esses eventos é complicado pra caramba e confesso que não é nada legal, mas é meu dever e obrigação. Eu o coloquei nesse mundo, então eu preciso cuidar e educar para que seu futuro seja bacana. O pai dele, que é meu parceiro, infelizmente não consegue dar o apoio que gostaria, então eu fico responsável por todas essas questões”, conta.

Hoje, todas essas mulheres guerreiras ainda encontram desafios e julgamentos, mas descobriram em suas histórias e em seus filhos, o verdadeiro amor.

“Meu recado para as mães é que tudo passa, o pânico, a vergonha, porque eu creio na força sobrenatural da mulher em ser mãe solo, profissional e ainda ter um grande e novo amor. Você consegue criar e dar o melhor sozinha sim, você pode ir sozinha nas festinhas de comemoração da escolinha do seu filho(a), e será o seu melhor e verdadeiro amigo(a). O reconhecimento final vem em uma frase assim que ouvi do meu filho: “Mãe, você é o meu exemplo”, finaliza Rosangela.

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